domingo, 30 de novembro de 2008

Siderado

- Hã? O que você disse?

- Perguntei se como se sente diante da possibilidade de ela não gostar mais de você.

Essa pergunta foi o suficiente para que ele se desse conta de que ainda não havia se questionado a esse respeito, pois, para si, a única possibilidade existente era a de estar com ela por toda a eternidade. Os fatos, contudo, não apontavam nessa direção e, por uma necessidade muito parecida com a que os cristãos têm de saber se habitarão o paraíso quando de sua morte, ele precisava manter a esperança de que um dia pudesse ter sua presença mais uma vez. E a resposta que tinha para dar ao seu amigo era o silêncio, pois não sabia como dizer: “eu não sei”. Isto seria como que admitir a iminência do fim e que nada restaria para si a não ser lidar com a dor da perda do grande amor de sua vida. Seus olhos ficaram parados, como que olhando fixamente para algo que apenas ele via – a cena de uma adeus que teria que acontecer, mais cedo, ou mais tarde. Seu semblante não poderia ser descrito como tristeza, pois, na verdade, não encontrava correspondência nenhuma em palavras e poderia ser resumido à seguinte sensação: um formigamento no estômago, como se estivesse devorando a si mesmo e, assim, levando junto aquela saudade absurda, pois os dias se passavam e nada mais importava para si, a não ser o incontrolável desejo de estar ao lado dela e se sentir feliz. Feliz. Que adjetivo estranho, este, em sua circunstância atual. Chegou, então, a se perguntar qual a última vez em que se considerou feliz. Não conseguiu encontrar registros recentes dessa época e, então, um nó na garganta represou-lhe uma completa inundação de lágrimas que estava por vir. “A vida é um processo miserável” – pensou no mesmo instante em que se viu tomado por essas sensações. Na verdade, agia assim por tentar parecer um intelectual e falar do processo “vida”, mas sabia que falava de si, falava da miserabilidade que vinha sendo a sua vida. E continuou suas divagações sobre a (sua) vida: “Vive-se para simplesmente se manter vivo e o que vier além disso é luxo, frescura”. Seu olhar permanecia siderado, tomado por uma idéia que, mesmo diante dos fatos, até então, não havia concebido e, o pior, pela constatação de que apenas se mantinha vivo e nada mais. Sentiu, então, seu estômago se remoendo, como que digerindo aqueles dados que acabara de compreender a respeito de si. E, quanto mais se remoía o estômago, mais sentia a solidão. Parecia que passava a si mesmo num liquidificador, num sofrimento que não conseguia produzir palavras, apenas dor e confusão. Enquanto isso, seu amigo o olhava, sem compreender muito bem o que se passava, sabendo apenas o essencial: ele não estava ali. Até que, depois de alguns minutos, que mais pareceram horas, ele respondeu:

- Não sinto. Fico dormente. É como se me faltasse por inteiro e o que sobra é uma carcaça que não é mais capaz de amar.

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