...e tudo o que via era escuridão, porque simplesmente sentia que esse era o único caminho que lhe restava. Não era cego, tampouco estava assim pela falta de luz. Sabia que pelo caminho havia bombas espalhadas pelo chão e que, portanto, poderia se machucar, ou, até mesmo, morrer. Mais valia para si a sensação de ter os braços abertos, mesmo sabendo que o que queria abraçar não lhe caberia nos braços, pois a falta de humildade de seu desejo exigia-lhe um abraço em todas as possibilidades que a vida tinha para lhe oferecer – até mesmo a falta de vida. Diferenciava-se de um kamikaze, pelo simples fato de não ter certeza de absolutamente nada, a não ser de seu desejo de um abraço que não lhe cabia nos braços. “Cuidado, você vai se ferir!” – gritavam atônitas pessoas que simplesmente o viam caminhar lenta e cegamente por uma trilha tão perigosa, sem compreender que, para ele, mais perigoso era não caminhar. Não, não se tratava de necessidade. Era mais, muito mais. Talvez por isso, quem observava não entendia. “Afinal, pra onde caminha aquele louco?” – era isso que o olhar dos curiosos expressava. Mas e daí? Ele não poderia vê-los, pois lhe encandeava a clareza da necessidade de escuridão que o guiava naquele instante e a certeza de que, apesar de seu desejo de chegar vivo do outro lado do caminho, independentemente do estado e do lugar em que chegasse, teria os braços repletos de vida, pois, vale lembrar, eles estavam abertos. Na verdade, estavam escancarados, mais parecendo um compasso, só que sem qualquer objetivo matemático, pois não havia cálculos, apenas movimento e entrega. A sensação era de se jogar no mar, sabendo que não seria possível alcançar o chão e, ao invés do desespero de quem teme morrer afogado, deleitar-se com a vastidão das águas que o banhavam naquela hora. Surpreendia-se com a lucidez que conseguia possuir na escuridão, pois se guiava, de modo seguro, por uma pulsação que tomava conta de todo o seu corpo. Eram batidas como as de um coração, mas realizadas com o corpo inteiro, seguindo um ritmo que lhe era peculiar e cujo som não poderia ser auscultado por nenhum estetoscópio. “Tum, Tum.. Tum, Tum...” – a cada batida, um passo e, a cada passo, a exigência de se caminhar cada vez mais despido de certezas, de todas as experiências que houvera tido até então. Sentia-se como se um banho de vida no meio de um caminho tido como perigoso tomasse conta de si, naquele instante, e que nada poderia tirar-lhe a convicção de que era naquelas águas que desejava se molhar...
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