segunda-feira, 2 de agosto de 2010

O jardineiro-jardim

E se um jardim pudesse falar? E se ao passar em frente a plantas bonitas, de bom cheiro, mas machucadas por maus tratos, ele se sentisse impelido a cuidar delas? Nunca havia se feito esta pergunta, ou cogitado tal possibilidade. De fato, de seres inanimados não poderia ouvir exigência alguma, a não ser uma necessidade que ele mesmo possuía de admirá-las, de compreendê-las como coisas e, assim, algo incapaz de pedir algo a alguém. Ele, que nem mesmo era jardineiro, ou imaginava possuir a habilidade de cuidar de qualquer planta, se viu cultivando algo. Por vezes, parecia um momento bobo. Cores bobas, gestos bobos, simples demais para parecer tão potente, tão poético. E aconteceu assim: sem mais, nem menos – no tamanho e na forma exata para se capturar – ou seria o nome disso liberdade? Era ilógico para si pensar isto; afinal, deixar-se capturar pela exuberância de um jardim sem nem mesmo saber o nome das plantas que ali havia, ou receber qualquer instrução sobre que cuidados ter. Passou na rua, viu as bonitas flores ali plantadas e, quando deu por si, já as cuidava, como se já fosse sua função há muito tempo. Suas técnicas – se é que as possuía – se confundiam com uma sincronia leve e harmônica entre o desejo de contemplar as flores do local e a necessidade de contribuir para que aquela paisagem, já bela, lhe parecesse exuberante. Para si, era como uma dança, embora não soubesse dançar. Tratava-se de dança, porque tudo era movimento, transformação e enriquecimento. Aliás, isso se dava de modo mútuo, para sua grande surpresa. Percebia que cuidar do jardim era também cuidar de si e se perceber crescendo junto e não soube, então, distinguir, se de fato era um jardineiro ou se também era jardim.

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